O ministro de Minas e Energia do governo de Luiz Inácio (PT) voltou a defender a exploração de petróleo na Margem Equatorial ontem (25/2) em um do CEO Conference, evento organizado pelo BTG Pactual em São Paulo. “Enquanto o mundo demandar, não vamos ser nós que vamos poder deixar de ofertar”, comentou o ministro. 5k394m
A declaração ocorre na esteira de polêmicas recentes sobre a exploração de petróleo na região, que fica a 160 quilômetros (km) da costa de Oiapoque, no Amapá (AP) e a 500 km da foz do rio Amazonas.
No início do mês, o mandatário Luiz Inácio (PT) criticou o “lenga-lenga” do Ibama em relação à permissão da exploração na região. O presidente também criou um clima ruim com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ao dizer que a representante não “será contra explorar a Margem Equatorial porque é inteligente”. Dias depois, Silva defendeu o fim da exploração de combustíveis fósseis.
A pretensa radicalização de Luiz Inácio sobre o tema busca pintar o mandatário como um defensor da soberania nacional, enquanto na verdade o governo esconde os verdadeiros interesses por trás da exploração do petróleo na região. Abaixo, veremos: o atual cenário das reservas de petróleo no Brasil; por que é falsa a tese de soberania nacional ligada à exploração na Margem Equatorial; quais são os impactos ambientais associados a essa exploração; quem lucra e quem fica com os prejuízos.
1. O cenário brasileiro de reservas de petróleo w1r3e
O Brasil é o 8º maior produtor de petróleo do mundo, com 3,4 milhões de barris explorados diariamente em 2023, segundo a Energy Institute.
O País tem 15,5 bilhões de barris em reservas comprovadas, mas a taxa pode chegar a 22,7 bilhões ao considerar reservas prováveis e possíveis, conforme dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
O geólogo Pedro Victor Zalán estima, em um estudo publicado na revista científica Derbyana em agosto de 2023, que as bacias sedimentares brasileiras reservam um potencial de recursos de óleo e gás não descobertos na ordem de 50 a 100 bilhões de barris recuperáveis.
É nesse cenário potencial que se insere a Margem Equatorial, no qual o caderno Estimativas Volumétricas da Bacia da Foz do Amazonas, publicado pela pela Empresa de Pesquisa Energética, estima 6,2 bilhões de barris recuperáveis para a região da Foz do Amazonas, com potencial de até 10 bilhões de barris.
Acontece que, no atual modelo brasileiro, em que vigora um regime de capitalismo burocrático, a exploração das extraordinárias reservas petrolíferas brasileiras não significa o desenvolvimento da Nação e o atendimento dos interesses das massas populares.
O pré-sal, por exemplo, alardeado como solução para os problemas econômicos do país, já produziu mais de 5,5 bilhões de barris em 15 anos. No entanto, os problemas estruturais do País, como a crise energética, persistem e não houve melhora significativa na vida das massas populares, nem mesmo nos estados produtores.
Mesmo o preço dos combustíveis é muito elevado no País e atrelado aos preços internacionais, por conta da dominação imperialista e do servilismo das classes dominantes do Brasil. Mesmo com o fim da política de Preço de Paridade Internacional (PPI), o preço do combustível brasileiro obedece as cotações internacionais, com constante chantagens das refinarias privadas e dos magnatas do petróleo organizados em cartéis como a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom).
Por que, então, a exploração na Foz do Amazonas mudaria essa realidade?
2. O petróleo é nosso? Quem fica com o lucro? 59353q
A Petrobras tem um valor de mercado de aproximadamente R$ 523,6 bilhões e distribui um rendimento de dividendos de quase 20%. No entanto, a composição acionária revela que 46,38% da empresa pertence a investidores estrangeiros, 37,06% ao governo e 16,56% a investidores brasileiros.
Entre os dividendos pagos em 2024, que somaram mais de R$ 64 bilhões, aproximadamente 63% foram destinados a grandes acionistas privados (74% estrangeiros), enquanto apenas 37% ficaram com a União. Esse montante, por sua vez, está sujeito ao arcabouço fiscal (o novo teto de gastos) desenhado pela equipe econômica de Luiz Inácio, destinando-se prioritariamente ao pagamento de juros da dívida pública e ao superávit fiscal, sem retorno para a população.
A exploração de petróleo e gás natural no Brasil, seja pela União ou por empresas privadas, gera o pagamento de royalties, uma compensação financeira pela extração desses recursos não renováveis. Esses royalties também são utilizados como uma justificativa para a exploração, garantindo retorno financeiro aos estados e municípios produtores. O valor arrecadado depende da alíquota aplicada ao campo produtor (variando de 5% a 15%), da quantidade extraída e do preço de referência dos hidrocarbonetos no mês. Em 2024, o Brasil arrecadou R$ 58,2 bilhões em royalties, distribuídos da seguinte forma: 26% para os estados produtores (R$ 15,6 bilhões), 34% para os municípios produtores (R$ 19,9 bilhões) e 40% para a União. Os pagamentos são realizados mensalmente pelas concessionárias e distribuídos conforme os cálculos da ANP, seguindo a legislação vigente (Leis nº 9.478/1997 e nº 7.990/1989, regulamentadas pelos Decretos nº 2.705/1998 e nº 1/1991). Apesar dessas cifras bilionárias, a classe trabalhadora segue sendo alvo de repressão, carestia e violência estatal nas favelas e no campo.
Diante disso, um dos grandes interesses por trás da exploração na Foz do Amazonas é gerar royalties bilionários para o Amapá, estado de Davi Alcolumbre (União Brasil – AP), presidente do Senado Federal eleito com apoio do governo de Luíz Inácio. Por isso, ele pressiona o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para conceder a licença ambiental, pressão essa reforçada pelo próprio Luiz Inácio. O Ibama, contudo, classifica a exploração da região como de “risco máximo”, identificando 18 impactos negativos. As fortes correntes marítimas elevam o risco de vazamentos, dificultando a contenção dos danos e ameaçando a biodiversidade marinha e os litorais.
3. Questão ambiental: quem fica com o prejuízo? 3p3n5r
Os blocos que se pretende leiloar estão a menos de 200 km do litoral do Amapá, na plataforma continental brasileira (porção mais rasa do fundo oceânico). A plataforma continental da Margem Equatorial abriga vastas áreas de fitoplâncton, fundamentais para o ecossistema marinho. Essa região desempenha um papel essencial no sequestro de carbono, sendo mais eficiente nesse processo do que a própria Floresta Amazônica, segundo pesquisas do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), coordenado pela pesquisadora Luciana Gatti. A exploração de petróleo na área, além de ampliar as emissões de CO₂, pode comprometer um dos principais reguladores climáticos do planeta.
Esse cenário agrava a crise climática, cujas consequências recaem, sobretudo, sobre as massas populares e mais precarizadas – que, como já dito, não são beneficiadas pelos lucros da exploração do petróleo. As promessas de desenvolvimento associadas à exploração petrolífera não am de ilusão, ou o velho e requentado nacional-desenvolvimentismo reformista. A história recente do pré-sal já demonstrou que os ganhos são apropriados pelas classes dominantes, enquanto o povo herda os prejuízos sociais e ambientais.
4. Conclusão 2o513n
Diante desse quadro, é evidente que a exploração de petróleo na Margem Equatorial não trará melhoria alguma para as massas populares do País.
É verdade que a estação petrolífera na Margem Equatorial pode gerar novos empregos. Mas também pode ser feito por outras alternativas, como a ampliação dos postos de trabalho nas estações ou refinarias já existentes (as refinarias brasileiras são conhecidas por operarem abaixo da capacidade máxima) ou pela construção de novas refinarias, particularmente capazes de refinar o petróleo brasileiro – uma necessidade mais urgente do que um novo campo de extração de petróleo.
O discurso farsesco do governo, que agora finge assumir uma postura “combativa” em relação ao tema, apenas encobre a verdade: a verdadeira soberania nacional só pode ser alcançada com um governo popular e democrático, imposto por uma Revolução Democrática.
No atual modelo brasileiro, os benefícios da exploração do petróleo são saqueados pela grande burguesia e pelo imperialismo, mesmo no caso estatal, em que a espoliação é menos severa e direta que no caso das explorações “privadas”, mas ainda serve aos interesses das classes dominantes, dado o caráter burocrático-latifundiário do Estado brasileiro e sua condição de serviçal do imperialismo.
Henrique Santana é doutorando em Geociências na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e integrante do grupo de pesquisa Geotecnologias (Unicamp). Escreve sobre política, recursos naturais e soberania nacional.
Esse texto expressa a opinião do autor.