Ocorreu no dia 26 de janeiro, em Campina Verde (MG), o julgamento do camponês Luzivaldo de Souza Araújo – preso político desde 2019, e, agora, condenado, segundo familiares e moradores da região, por um crime que não cometeu. Organizações populares como a Liga dos Camponeses Pobres (L), Liga Operária, Frente Nacional de Luta Campo Cidade (FNL), ativistas, uma comitiva de advogados populares e personalidades ligadas às entidades de defesa dos direitos humanos somaram-se aos familiares exigindo a liberdade imediata para Luzivaldo e criticando a condução do processo como farsa. 4q6i2h
Um apoiador do AND esteve presente no julgamento e criticou a conduta do promotor. Os presentes afirmam que o promotor considerou “afrontas à justiça” o fato dos moradores da cidade participarem do julgamento assistindo. A sessão, por 4 votos contra 2, decidiu pela condenação por 15 anos e 10 dias de prisão em regime fechado de Luzivaldo. Segundo os presentes, o promotor fez indagações dúbias aos integrantes do júri popular e usou adjetivos e expressões para macular a imagem de Luzivaldo.
O militante Luzivaldo – que também é conhecido como “Baiano” – foi condenado por “ameaças” contra autoridades e homicídio contra o camponês Danilo Silva, encontrado morto com cinco perfurações (sendo uma delas por arma de fogo) em 25 de novembro de 2018, próximo à área Boa Viagem em Campina Verde. Já os moradores da região, todos que o conhecem e seu advogado afirmam que o processo foi viciado, que não há provas e que trata-se de uma perseguição político.
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Companheiros e familiares de Luzivaldo são intimidados pela PM 3v1m1s
As expectativas de que o judiciário condenaria Luzivaldo eram grandes, uma vez que Luzivaldo tem sido mantido encarcerado desde 2019, sem uma prova fundamentada e, principalmente, sem testemunhas de que fora autor do crime. Antes do início do “julgamento”, familiares e companheiros de Luzivaldo aguardavam na porta do Fórum, com faixas e bandeiras dos movimentos. A banca de advogados defendendo Luzivaldo era formado pela Associação Brasileira dos Advogados do Povo – Gabriel Pimenta (Abrapo), com participação de Marino D’Icaray (RJ), Cristina Paiva Matos Pontes (MG), Felipe Nicolau do Carmo (MG), Hugo Escher Martins (RJ), João Pedro Barreto (RJ), Lucas Fortunato Barbosa (GO) e Dereck Eyd Sabbagh (RJ).
Segundo um apoiador de AND, a simples presença dos familiares, ativistas e advogados defendendo justiça para Luzivaldo foi suficiente para que a Polícia Militar fosse acionada. Com cinco viaturas, cassetetes, escopetas, balas de borracha e etc., as tropas policiais tentaram intimidar o povo.
Ao descer do carro do Sistema Penitenciário, Luzivaldo pôde avistar seus companheiros que entoavam palavras de ordens: Liberdade já! Luzivaldo é inocente! Isto fez movimentar as tropas, em busca de lideranças e querendo identificar os manifestantes. Em clara afronta ao direito de livre manifestação, o militante da FNL, Geraldinho, foi interrogado pelo tenente da PM, Denes Lander.
Os advogados conseguiram, através de pedido ao Juiz da Comarca de Uberaba (Stefano Raymundo), que Luzivaldo pudesse ver os seus filhos antes da audiência. Também garantiram com que os companheiros de Luzivaldo acompanhassem o “júri popular” da sala de audiência, desde que, em silêncio e sem manifestações.
O julgamento farsante 4y636r
Segundo os advogados de Luzivaldo, a participação das supostas testemunhas do crime no julgamento explicitam seu caráter parcial. Elas não teriam trazido qualquer elemento ou fato que comprovasse algum envolvimento do camponês Luzivaldo.
Através de depoimento por vídeo-conferência, uma testemunha não sabia afirmar os fatos e em sua explanação apenas relatou boatos e coisas que ouviu de outras pessoas; um policial civil alegou ter feito a investigação do caso, mas não mostrou nenhuma prova referente ao envolvimento de Luzivaldo em crimes (o normal, nestes casos, é a apresentação de exames balísticos ou mesmo armas do crime, não apresentados). Este policial acabou, também, baseando todo o seu depoimento em boatos, alegando “medo de represálias”.
Uma das advogadas de defesa chegou, neste momento, a perguntar se o policial conhecia os mecanismos que asseguram denúncias de crimes através do anonimato, ao que ele respondeu que não. Ao ser perguntado sobre detalhes da investigação, o policial afirmou que esteve na área Boa Vista e que “ouviu dizer que foi o ‘Baiano’ [Luzivaldo] que havia assassinado ‘Branco’”. Contudo, ele não foi além e nenhuma prova, evidência ou indício foi apresentado.
Em convergência objetiva com os interesses do latifúndio local, a quem interessa a prisão do Luzivaldo como dirigente camponês local, o promotor de justiça da comarca de Campina Verde, José Cícero Barbosa da Silva Júnior, prosseguiu com a acusação mesmo sem provas, segundo seus advogados. Além disso, em certo momento da sessão, o promotor citou nominalmente um a um os integrantes do júri popular antes de dar o aviso de que estava “nas mãos” de cada um deles. “Não podemos deixar que venham aqui e desmoralizem a nossa polícia, o delegado e os produtores rurais”, afirmou em certo momento. E, de forma histérica, disse: “Eu sou o Promotor de Justiça dessa cidade e não vou deixar que venha aqui dizer o que fazer em minha terra”.
Para tentarem evitar ações desse tipo, os Advogados do Povo, defensores de Luzivaldo, tentaram transferir o “julgamento” do caso para Belo Horizonte, sob a alegação de que o “julgamento” em Campina Verde, inevitavelmente, correria o risco de parcialidade, já que a cidade é pequena (18 mil habitantes) e os latifundiários, através de coerção econômica, militar e política, acabam por controlar o “júri popular”. As preocupações se comprovaram, uma vez que o próprio promotor fez questão de deixar claro de que em Campina Verde a lei é diferente, pois é aquela “a sua terra!”.
A defesa de Luzivaldo tratou de desmontar os argumentos da acusação. O advogado Marino D’Icarahy classificou como uma “fofoca”, “mimimi”, “uma armação, para tentar criminalizar” o camponês. A advogada Cristina tratou de pegar os pontos técnicos do processo e, de forma simples, desmontou os argumentos do promotor.
Protesto irrompe no tribunal após condenação injusta 5q5l4a
Após a condenação pelo júri, os companheiros de Luzivaldo deram provas de que a luta pela liberdade do camponês preso político não terá fim. Denunciando a farsa do julgamento, a palavra de ordem Liberdade já! Luzivaldo é inocente! foi entoada três vezes após a leitura da sentença injusta.
O AND acompanhará os próximos os do caso e, nos próximos dias, divulgará uma entrevista com a equipe de advogados que realizou a defesa jurídica de Luzivaldo.