Há cerca de 500 anos, quando as Américas foram “descobertas” e invadidas por Espanha, Portugal e outros aventureiros, houve um debate entre as classes dominantes européias sobre os índios aqui encontrados. Eram seres humanos? Ou não? x4w3i
ados tantos séculos, as classes ricas da semicolônia Brasil, principalmente os latifundiários-fazendeiros do agronegócio (sim, os heróis de certas propagandas da TV ou as “vítimas” da operação Carne Fraca conforme a servil Rede Globo e o resto da mídia burguesa monopolista) se decidiram, tudo indica, pela resposta negativa. Ou seja: não, os indígenas não são humanos como o resto das pessoas. Ou são menos humanos do que se pensa por aí. Ou não merecem ser tratados como seres humanos. Enfim, resumindo, em outras palavras: não vale a pena perder nosso precioso tempo com eles.
Os velhos “conquistadores”/invasores do século 16 foram mais progressistas que esses moderníssimos executivos gigolôs de bois e reis dos agrotóxicos e motosserras. Pois naquela época antiga concluiu-se que os índios tinham alma, e portanto, eram homens. Embora, é bom que se diga, tenha sido uma postura hipócrita. Isso porque o massacre contra a população nativa continuou. Com alma ou sem alma, a indiarada levou só pau nos anos 1500. E segue levando agora.
A situação é tão feia que há índios no MS (Mato Grosso do Sul) que estão resistindo à agressividade do latifúndio através da própria morte. Os Kaiowá estão se suicidando aos montes, sob o olhar intrigado dos guerreiros, a grande maioria, que preferem as formas costumeiras de luta.
De qualquer modo, os suicídios parecem ser a reedição (trágica, desesperada e talvez equivocada) de uma revolta indígena singular efetuada nos anos 1500, principalmente por guaranis e incas. Numa espécie de greve geral, no Brasil, no Paraguai e na cordilheira dos Andes, os índios pararam de trabalhar para os patrões brancos/poderosos, dedicando-se totalmente a práticas culturais seculares (como danças e cantos), até morrerem de cansaço, desnutrição e brabeza.
Entre os Guarani, este movimento foi chamado de Rebelião de Oberá. E entre os incas de Dança Enferma.
Agora, nos dias atuais, os Guarani e Kaiowá do MS estão protestando contra a classe que os espolia e oprime, através do próprio enforcamento, o qual envolve um grande simbolismo. Isto é: ao enforcarem-se mostram que sua voz/grito/garganta/palavra está sendo cortada-negada pelos inimigos fazendeiros. E a palavra pode encarnar um poder tão forte quanto os cabelos eram para Sansão.
Conforme o jornal Globe and Mail, do Canadá, em reportagem recente (março de 2017), o número de suicídios entre os Guarani e Kaiowá é lamentavelmente 22 vezes maior que a média brasileira.
Viajando pelo MS, a jornalista canadense Stephanie Nolen afirmou que “(na estrada) depois de um tempo você percebe que muito mais terra foi dada às vacas do que aos humanos indígenas”.
Portanto, pela enésima vez, nada a comemorar neste Dia do Índio.
Saudações aos leitores e companheiros do AND !
Rosana Bond*, Florianópolis-SC, 20 de abril de 2017.
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*Rosana foi repórter e editora deste jornal durante vários anos. Por ter sofrido um AVC e estar ainda em tratamento é integrante licenciada do Conselho Editorial.