Dentre as inúmeras injustiças que assolam os trabalhadores terceirizados, a redação de AND tomou conhecimento, através de um colaborador professor do tradicional Colégio Pedro II, da situação de Rafael França. Após meses sem receber salário, Rafael, que era empregado da Tecnisan, empresa que presta serviços ao colégio, foi demitido por “justa causa” por ter exigido seus direitos. Uma campanha está sendo movida contra esta tentativa de intimidação dos trabalhadores e colocando em pauta, entre estudantes e trabalhadores, a questão da terceirização. Em depoimento ao AND, Rafael França falou de sua situação. 5a4ic
AND: Antes da demissão por justa causa, quando você se recusou a o ponto, há quanto tempo você estava sem receber salário? Como a Tecnisan tratava os funcionários, mais algum sofreu atraso?
Rafael: Em nenhum momento havia me recusado a o ponto até ocorrer a manobra da reitoria [fiscais de contrato] de obrigar todos os funcionários a trabalhar sem receber os salários e os benefícios. Estava há 2 meses sem salário e 3 sem tíquete alimentação. O meu atraso foi pago sim, com atraso também, pois fui demitido antes de encerrar o contrato da empresa com o colégio e só me foi pago o salário atrasado depois disso. A Tecnisan nos tratava com total descaso e falta de responsabilidade e sensibilidade, o que nunca atrasou foi o vale transporte. A empresa sempre colocou a culpa no colégio dizendo que foram eles que não haviam pago e por isso também não estavam nos pagando. Após isso sempre nos deram prazos e datas que nunca cumpriram e nos pediam para ligar na sexta-feira às 16h, só que desligavam o telefone, uma tremenda falta de respeito conosco.
AND: Você considera que sua demissão ocorreu por motivo de perseguição política, por você ter participado de lutas por melhores condições de trabalho?
Rafael: Eu não tenho dúvidas de que minha demissão foi para servir de exemplo a todos os meus colegas que reclamassem os seus direitos. Uma coisa que me surpreendeu foi que, quando fui na empresa, uma funcionária do RH me falou que eu estava sendo demitido por justa causa e que foi a mando do colégio. Eu nunca tive medo ou vergonha de me expor e o nosso problema. Todos no colégio já sabiam que eu estava junto com o sindicato para tentar resolver os pagamentos atrasados.
AND: O que o Sindicato dos Servidores do Colégio Pedro II (Sindscope) tem feito em relação a isso? Qual a posição da direção do Pedro II?
Rafael: O Sindscope me apoiou desde o começo, cedendo espaço para reuniões, conversas e auxílio na luta pelos nossos direitos. Depois da demissão, abraçaram a minha causa e fizeram uma campanha na comunidade escolar — #SomosTodosRafaelFrança2 — que consideram emblemática por conta do PL das terceirizações e também por nos reconhecer como servidores públicos terceirizados, também pedindo audiências no conselho superior e com o reitor do colégio. A posição do colégio, quando questionado, a princípio, foi dizer que desconhecia, mas como não foi um fato pequeno, foi itida falha e essa falha está provada por documentos. Em nova campanha para a reversão da justa causa junto à reitoria, eles enviaram um comunicado assinado pelo reitor para que não se fizessem mais valer as minhas transgressões.
AND: Qual a sua opinião em relação às terceirizações?
Rafael: A minha opinião sobre o serviço terceirizado, agora que já trabalhei em várias empresas e tenho alguns anos de profissional, é que é um serviço totalmente degradante e desesperançoso. A coisa que fica mais clara em mim quando eu trabalho é que sou discriminado por ser um trabalhador contratado por outra empresa e não ‘da casa’, por eu estar com uma roupa diferente dos outros. Ela é como uma marca, um símbolo de que eu não tenho o mesmo valor dos outros funcionários. Já trabalhei no setor privado e no público e posso dizer que só alguns detalhes são diferentes nas relações precárias de trabalho, mas o preconceito é o mesmo.
AND: Fale-nos um pouco sobre a campanha que tem sido movida em seu apoio e alguma consideração que ache importante fazer a mais.
Rafael: Olha, tem sido uma campanha bem dura e árdua, pois cada pequena vitória foi através do nosso esforço. A campanha foi uma proposta feita na assembleia do Sindscope em que a categoria estava decidindo greve neste ano. Mesmo antes da minha demissão, eu estava já junto com o sindicato para tentarmos resolver os nossos pagamentos atrasados. Após a demissão, aí que o sindicato e os servidores enxergaram em mim o triste amanhã deles, pois estava em debate o PL 4330. E nisso foi breve deles quererem apurar o que aconteceu e ter resposta por parte do colégio. Num primeiro momento fomos ignorados, mas, a medida que a campanha avançou, cresceu, fizemos um ato com carro de som e entramos numa reunião do conselho superior do colégio, o Consup. Tivemos resposta e também pedimos para que fosse anulada essa justa causa e o reitor mandou um e-mail para a empresa falando sobre eu ter cometido transgressões. Mas a maneira que o reitor se expressou não foi efetiva, e também estamos numa campanha pela minha issão na nova empresa que está prestando o serviço no colégio. Foi aprovado na assembleia deles também o apoio material que eles têm dado todo o mês, pois estou desempregado.
Achava importante a campanha ganhar mais força com a adesão e pressão de mais servidores. Agora que estão em recesso e interromperam as assembleias, parece que eles esqueceram ou não sabem o que está acontecendo. E também quero levantar uma bandeira de que se abra essa caixa-preta dos contratos terceirizados, onde os fiscais, ao invés de fiscalizar as empresas terceirizadas, só estão ali para cobrar o trabalho dos trabalhadores e assediá-los em seus serviços e funções já precarizadas.